segunda-feira, 6 de abril de 2009

Roberto Jorge Santoro

Nasceu em Buenos Aires em 17 de abril de 1939. Foi pintor, repositor, professor em uma escola industrial, tipógrafo, vendedor ambulante e poeta. Foi sequestrado por elementos do terrorismo de Estado em 1o de junho de 1977. O levaram ilegalmente de seu trabalho. Até hoje se encontra desaparecido.

Se apresentava assim: "sangue tipo A, fator RH negativo, 34 anos, 12 horas diárias a busca castradora, desumana, do soldo que não se alcança. Dois empregos, escritor surrealista, ou melhor, realista do sul. Vivo em uma engrenagem. Filho de operários, tenho consciência de classe. Rechaço ser travesti do sistema, essa podre máquina social que faz que um homem deixe de ser um homem, obrigando-o a ter um despertador no cú, um bilhete de loteria na cabeça e um cadeado na boca."


Segue uma tra(b)dução:

AS COISAS CLARAS


minha voz está em seu lugar
o coração sabe algo mais porque me dói

por isso digo:
terrível ofício
é repartir equivocadamente os abraços
e que a alma viva entre cachorros esfomeados

um de meus erros
foi crer que todos éramos irmãos

e agora
não se pode trocar o horizonte pela nostalgia
há que esquecer-se dos velhos sorrisos
e andar com a dor às costas
para que sirva definitivamente

nunca disse
minha lágrima foi grande
sofri
não me quiseram

cada um conhece sua dor
e sabe de que maneira conversar com a desgraça

que venha a vida e me golpeie
de nada vale fechar os olhos

um homem dormindo
é uma dor que descansa

é duro o amor quando se nega
um dia no entanto recosta seus abraços
apoia seu mistério em minha cabeça
e me leva a viver no primeiro piso de um incêndio

não comparo
simplesmente dou meu fruto
e espero

da semente mais humilde
pode brotar o fogo ou a formosura

se estou encurralado entre dois beijos
decido me enroscar ao pé de meu coração
e sonho

sou triste até os sapatos

à hora do chá
minha alegria se senta e chora comigo

mas sustento que um dia
ainda que o amor seja o irmão implacável da chuva
da minha casa a teus olhos
não haverá naufrágios.

(De Las cosas claras, 1974)